O exílio e o seu final, relatado pelo Pe. Kentenich *

Introdução

Os 14 anos de exílio do fundador chegaram a um fim dramático no Outono de 1965. Para o fundador e para a Família de Schoenstatt foi um “milagre da noite de Natal”.

Alguns dias mais tarde, em 3 de Janeiro de 1966, o Pe. Kentenich relatou estes acontecimentos numa série de palestras para os sacerdotes diocesanos de Schoenstatt da diocese de Münster. 

A conferência é particularmente valiosa porque apresenta de forma viva a experiência do fundador. Portanto, ao lê-la, aceita-se com prazer as interrupções no fio discursivo, os interlúdios e as reflexões em estilo de nota de rodapé. A historiografia crítica talvez corrija um pouco certos detalhes da exposição. O fato é que os acontecimentos se precipitaram e tornaram-se extraordinariamente dramáticos. A experiência pessoal do fundador, que nos mostra claramente tanto a distância interior aos fatos e acontecimentos em Roma como o empenho pessoal, mantém o seu valor especial e é absolutamente válida no que diz respeito à descrição dos acontecimentos mais importantes.

Relato do Pe. Kentenich

Ficou claro que os catorze anos de 1951 a 1965 constituem um período de luta incomparável. Concentremo-nos agora no significado desses catorze anos e no cumprimento desse significado. Também sabemos porque é que uma tal luta foi propositadamente evocada por mim. Neste contexto (e porque vocês o desejavam) gostaria de dizer algumas palavras sobre a audiência com o Papa. 

Nesse período de lutas, duas fases podem ser facilmente distinguidas:  

[A primeira etapa da luta: 1951 – 1963]

Reinava uma grande confusão. Uma após outra, todas as tentativas para trazer clareza ou de alguma forma desarmar as coisas em Roma falharam. Eu disse nessa altura que mesmo que as pessoas do alto escalão tomassem o nosso partido, isso não iria ajudar: assim que começassem a fazer alguma coisa, Deus chamá-las-ia à sua presença. 

Na verdade, eu era um neófito em relação a todos esses métodos correntes em Roma. Sempre pensei que eles eram tão apaixonados por encontrar a verdade como eu, pessoalmente, sempre tinha sido. 

Em Janeiro de 1952 deixei Roma, tendo aprendido duas coisas. 

A primeira veio de Monsenhor Kaas.(140) Ele disse-me uma vez que Pio XII tinha feito muitos esforços para reformar as Congregações romanas, especialmente o Santo Ofício;(141) mas a sua tentativa tinha falhado completamente. Foi a primeira vez que pude ver um pouco do que se passava nos bastidores. 

A segunda veio até mim através do Cardeal Lavitrano, então Prefeito da Congregação para os Religiosos. Era também um amigo fiel de Schoenstatt e sempre nos apoiou. Tinha contato com ele. Naquela época, a primeira luta entre a Congregação para os Religiosos e o Santo Ofício tinha estalado por nossa causa. Em maio de 1948, relativamente depressa, as Irmãs de Maria foram oficialmente reconhecidas. Tornaram-se de direito diocesano. No mesmo ano, íamos passar a ser de direito pontifício. Nessa altura procurou-se um título próprio: quasi juris papalis.(142) Mas o Santo Ofício interveio e protestou, alegando não ter sido consultado. Lá “em cima” acontece exatamente o que se passa no berçário. E assim é também observado em todas as situações da vida, em Dachau (campo de concentração onde o Pe. Kentenich esteve durante três anos. Nota do editor) e em todo o lado: onde há seres humanos, acontecem coisas humanas. O Cardeal Lavitrano estava completamente do nosso lado; e quando começou a defender-nos, morreu subitamente. Era uma lei geral: bastava que uma pessoa quisesse fazer algo por nós para que tivesse imediatamente a sentença de morte no seu bolso. 

Dele tenho uma declaração muito amarga e provocadora: se eu soubesse como a lei era administrada em Roma, nunca teria aceito o cargo de Prefeito da Congregação para os Religiosos. 

Trata-se de duas percepções que eu tinha: por um lado, a forte necessidade de reformar as Congregações ou, pelo menos, os métodos que são normalmente ali aplicados e, por outro lado, a forma como a lei estava sendo tratada. 

Isso levou-me ao seguinte pensamento: agora fique afastado durante anos e recolhe material que mais cedo ou mais tarde colocará à disposição do papa como material de informação. Naturalmente, tudo na eventualidade de poder e estar de fato disposto a apoiar seriamente os desejos de reforma da Cúria Romana. 

Não pensem que eu fiquei parado em segundo plano, ignorando tudo. Porque tudo o que de alguma forma dizia respeito a Schoenstatt vinha sempre diretamente para a minha direcção. E eu elaborava tudo. Em Milwaukee, escrevi o suficiente para formar uma biblioteca.(143) Eram sempre opiniões sobre todas as questões relativas à vida da Igreja, quer tivessem a ver com política, dogmática, ou pedagogia. 

Era assim que as coisas eram até 1959. Depois reparei claramente: agora tem de se defender; agora tem de enfrentar os principais adversários. Estes foram, antes de mais, os dois visitadores, o visitador episcopal e o visitador apostólico, e o geral dos palotinos. 

Havia uma grande diferença entre os dois gerais dos palotinos. O antigo geral dos Palotinos, Padre Turowski(144), pôs a sua honra em jogo e se defendeu ao máximo contra o Padre Tromp(145) e tudo o que ele empreendeu. Teve também a coragem de fazer um pedido ao Santo Ofício. Nele expressou a seguinte convicção: Padre Tromp pode ser um bom especialista em apologética, mas o seu conhecimento dos assuntos em questão nessa altura não era suficiente. Por isso propunha a nomeação de um novo visitador. Foi assim que ele expôs ao Cardeal Ottaviani, Prefeito do Santo Ofício. Ele disse certamente que sim, mas não fez nada. 

Por isso, comecei a discutir academicamente com os três. Deveria haver paz naquilo em que concordávamos. Mas onde havia diferenças, eu queria ir ao Papa e envolver-me em procedimentos legais sérios. É importante dizer que nunca se tratou de obter um indulto. O objetivo era sempre uma reabilitação jurídica plena e perfeita. 

Comecei então a debater com Tréves. Inspirado por Newman, escrevi um pequeno ensaio. Talvez saibam que Newman também teve uma vez de se defender num ensaio que intitulou: Apologia pro vita sua. Eu intitulei o meu: Apologia pro vita mea.(146)

Quando se trata de questões jurídicas, sou muito exato. Mas, humanamente falando, não tenho nada de pessoal contra ninguém. Nessa altura as coisas estavam penduradas por um fio (eu não devia me comunicar com nenhum sacerdote de Schoenstatt), por isso fui ter com o bispo Michael Keller de Munster, o predecessor do atual bispo. A ideia era que ele lesse a carta e me desse a sua opinião sobre se era o momento certo para tomar esta iniciativa. A resposta foi que ele não queria dar uma opinião sobre o assunto; aconselhou-me a não me preocupar com tais coisas, que o Santo Ofício queria manter-me completamente afastado.  

A minha resposta foi: Aqui é uma questão de direito natural! Nem o Santo Ofício tinha o direito de prejudicar o direito natural. Ninguém tem o direito de caluniar ninguém. Eu não atuava de forma alguma contra qualquer disposição. Não atacava nenhum decreto, mas apenas me defendia de calúnias. 

No entanto, pensei: espera um pouco até que a situação seja talvez mais favorável. Por isso, não enviei a Apologia. 

E um segundo aspecto: também debati com o Padre Geral Möhler, que na realidade foi o expoente principal de todas as acusações contra mim. Não quero deter-me agora no assunto, para não desprestigiar ninguém. A carta foi escrita em 31 de Outubro de 1961. Um dia, esta carta fará história. Nela tudo é novamente analisado com grande precisão. São expostos os contextos fundamentais. Era minha intenção submeter a carta ao Santo Ofício. Fi-lo ao longo desses anos: os escritos foram dirigidos ao Geral, mas o verdadeiro destinatário seria o Santo Ofício. Se alguma vez lerem a carta, já não ficarão surpreendidos porque é que o Santo Ofício se sentia ferido até a medula. 

A reação foi que o Santo Ofício, usando todo o seu poder, atacou em todas as direcções. O nosso pobre Josef Schmitz (147) foi destituído do cargo. Também foi destituído o monsenhor Roth(148) E depois houve as outras ações tomadas nessa altura, por exemplo, contra a Obra das Famílias. Eu próprio fui pessoalmente sujeito a uma sanção eclesiástica. Os golpes seguiram-se um após o outro. Os fundamentos da sanção eclesiástica foram: desobediência e desrespeito pela autoridade eclesiástica.

A propósito, considerei conscientemente que uma tarefa muito importante não era apenas ensinar a obediência correta, mas também a sua prática em relação ao Santo Ofício. É a concepção de obediência que atualmente foi legitimada pelo Concílio. O que significa “sentire cum Ecclesia“? Fazer nossos os respectivos desejos da Igreja, com a respectiva concepção da Igreja. Até ao Concílio, a Igreja se considerou, durante séculos, basicamente como uma societas externa, não raras vezes de acordo com o direito burguês, e até mesmo ao modo de uma organização militar.  

É por isso que, até então, sentire cum ecclesia significava praticar a obediência militar. Mas uma vez que a Igreja veio a considerar-se como o povo de Deus, como a família de Deus, o que exigia o sentire cum ecclesia? Outro tipo de obediência: uma obediência familiar. Essa é a obediência a que eu pessoalmente sempre aspirei como um ideal elevado. E uma obediência familiar exige uma cota de franqueza. Temos de zelar para que seja praticada uma obediência madura, uma obediência familiar.  

Afirmei então, muito clara e inequivocamente, que a obediência por mim praticada era moralmente exata, asceticamente de alto valor e estrategicamente exemplar. Ou seja, exatamente o oposto da concepção do Santo Ofício. A luta se tornava cada vez mais intensa. Mas era algo que eu queria muito conscientemente: uma ideia clara que eu defendi conscientemente. Como em tudo o resto, foi uma questão de dar o exemplo pela vida, em todas as áreas, da Igreja das novas margens, como hoje, num certo sentido, foi oficialmente reconhecida pelo Concílio. 

Em que consistiu a sanção eclesiástica? Três dias sem celebrar a Missa e depois fazer exercícios espirituais. Bem, não foi muito. Não achei isso tão preocupante e pensei: espera, porque agora tens coisas mais importantes para fazer. Muito em breve chegou o aviso de que já era tempo de eu cumprir a sanção. Foi o que eu fiz. Depois de ter cumprido, por intermédio do Geral dos Palotinos, enviei o conteúdo das minhas meditações ao Santo Ofício. E o conteúdo das meditações foi o desenrolar de toda a história de Schoenstatt com a correspondente interpretação academica.

Ou seja, ousar ao extremo. 

Depois de ter refletido cuidadosamente sobre as coisas, foi-me colocada a grande questão: faz sentido continuar neste caminho? Entretanto tinha ficado claro para mim (uma vez que tinha penetrado profundamente até o fundo) quão pouco o papa podia agir por si próprio, e quão fortemente estava, de uma maneira geral, cativo do seu ambiente. Pensei então que a lei da porta aberta estava se tornando a lei da porta fechada. Disse a mim mesmo: seria melhor esperar um pouco mais, até que o Concílio anunciado se torne uma realidade histórica. Esperarás do Concílio uma justificação da sua pessoa e uma justificação das suas teorias, dos seus ensinamentos. 

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Kentenich Reader

Textos originais valiosos do P. Kentenich

[A segunda etapa: o Concílio Vaticano II]

O Concílio chegou. Na verdade, no essencial, o Concílio concorda conosco. Mais ainda, em muitas coisas, estávamos muito à frente do Concílio.

Falamos de uma missão pós-conciliar e de uma missão pré-conciliar da Igreja. É por isso que estamos certos ao dizer que a missão pós-conciliar da Igreja já era para nós a missão pré-conciliar da Família. Entretanto, dizemos que queremos fazer nossa a missão pós-conciliar da Igreja. Isto é verdade na medida em que agora a Igreja, através do Concílio, concorda conosco sobre as questões fundamentais. Podemos chamar nossa missão de pós-conciliar porque a Igreja se concebe como sempre a concebemos. A grande diferença entre ontem e hoje reside apenas no fato de que as concepções opostas do episcopado desapareceram da Igreja, pelo menos em princípio. E agora existe, em princípio, uma e a mesma atitude fundamental.  

Valeria a pena lançar luz, deste ponto de vista, sobre a concepção mais importante ou a missão mais importante da Igreja hoje. Enquanto isso, eu tenho dito a mim mesmo: na realidade o Concílio deveria ter começado onde ele terminou. O que isso significa? O Concílio parou onde chegou à questão central à qual a Igreja de hoje deve responder: a relação entre Igreja e mundo. Mas o próprio Concílio admitiu que ainda não estava pronto para abordar essa questão; e por isso se contentou com indicações gerais. 

O que eu esperava de fato aconteceu. 

Embora o Santo Ofício tivesse decidido me enviar de volta para Milwaukee, logo mudou essa decisão. O papa também queria me mandar de volta. Vocês não podem imaginar que confusão reinou em toda Roma, em todas as esferas, mesmo nas mais altas. 

Naturalmente, tudo isso teve a grande vantagem, todo o debate teve, entre outras coisas, a vantagem de nos tornar conhecidos em todo o mundo; tornamo-nos mais conhecidos do que o fio negro. A tal ponto que mais tarde em Roma não só fiquei em paz, mas recebi a visita de muitos cardeais e bispos. Em outras palavras, uma atmosfera totalmente diferente. 

Como todos tinham sido envolvidos na confusão (a Congregação dos Religiosos, o Santo Ofício, este e aquele cardeal até chegar ao Papa), isso naturalmente significava que todos tinham se ocupado de nós. Eu não poderia indicar-lhes um modo ou meio melhor pelo qual poderíamos ter nos dado a conhecer tão rapidamente no mundo inteiro. 

Além disso, quando se tornou conhecido o que o Santo Ofício e o Papa pretendiam fazer, começou um longo debate concreto e acadêmico. Também surgiram contra-correntes. Uma nova sessão plenária do Santo Ofício deveria ser realizada. E toda uma série de bispos estrangeiros se esforçaram para falar em particular com os padres que tinham voz e voto na assembléia plenária do Santo Ofício. Esclarecimentos, esclarecimentos e esclarecimentos foram feitos. E o resultado? O que não se podia esperar tornou-se realidade em 20 de outubro: todos os decretos contra o Padre Kentenich foram abolidos, com a curiosa fundamentação: como eu tinha a intenção de entrar no novo instituto, toda a situação havia sido revista e foi resolvido anular todos os decretos. Imagine então: eu não levantei um dedo e todos os decretos foram completamente abolidos. 

Para entender isto, devo primeiro ressaltar algumas coisas. Entretanto, em Roma, especialmente no Santo Ofício, havia sido adotada uma concepção totalmente oposta. Até aquele momento, eles tinham sido tão duros quanto ferro. Tinha sido reiterado que era impensável que eu pudesse alguma vez voltar à Alemanha ou ser reabilitado. Mas então foi assumida a opinião contrária. O Cardeal Bea (149) devia tratar comigo em nome do Santo Ofício, ou seja, oficialmente. E ele lidou comigo. Sua atitude básica foi: se o Concílio não tivesse acontecido, você nunca teria sido compreendido. Esta é a prova oficial de que o Concílio fez suas todas as coisas que eram comuns entre nós; reconheceu nas coisas principais que ensinamos desde o início e pelas quais empreendi conscientemente uma dura luta. 

O que eu gostaria de lhe dizer agora é o seguinte: você já ouviu dizer que pouco antes também o Padre Menningen havia sido reabilitado. Sua reabilitação foi mais simples porque ele não havia sido destituído do cargo pela assembléia plenária do Santo Ofício, mas por uma disposição simples, e ele não foi exilado. 

Meu caso foi naturalmente mais difícil. Não vou agora lhes dizer em detalhes como surgiu esta mudança radical. Mas vou lembrar que depois desta mudança, a Sociedade Palotina caiu das nuvens. Imagine como ela, que sempre havia compartilhado a opinião do Santo Ofício e se sentia protegida e legitimada por ele, de repente viu que o Santo Ofício pensava e trabalhava de uma maneira totalmente diferente. 

A forma como o Santo Ofício tratou rapidamente o caso do Padre Menningen deveria ser aplicado ao meu caso. Mas não seria feito até outubro, porque o secretário particular do Cardeal Ottaviani estava de férias e voltaria no início de outubro. Quando eu soube tudo o que deveria ser feito em Roma, vocês entenderão que fiquei surpreso quando recebi o telegrama em 13 de setembro. Naturalmente eu pensei: bem, tudo foi adiantado em um mês. 

Eu não sei se você conhece a história do telegrama. Ainda é um mistério. Mais tarde, vou revelá-lo a vocês com mais exatidão. No momento, é suficiente esboçá-lo. O telegrama era inequívoco, muito claro: em nome do Superior Geral eu deveria viajar imediatamente para Roma. Foi assinado por Burggraf. E dizia: “imediatamente”. E porque a palavra “imediatamente” foi escrita lá e porque as pessoas em Roma estavam sempre verificando minha concepção de obediência, eu disse a mim mesmo: tenha cuidado, aqui diz “imediatamente”. Certifique-se de que seja imediatamente. Caso contrário, será dito novamente: Ai de sua obediência! Então pedi à telefonista que me enviasse o telegrama por escrito. Porque o telegrama tinha sido antecipado para mim por telefone. Foi-me prometido que o faria. Quando ela me disse que tinha chegado um telegrama para mim, fiz uma observação engraçada. Quando chegava um telegrama em alemão, os americanos tinham grande dificuldade para pronunciá-lo em alemão, por isso o soletravam. Fiz um comentário engraçado: será engraçado se você tiver que soletrá-lo. Não”, disse ela, “o telegrama veio em inglês”.Então eu lhe disse expressamente. Favor enviá-lo. Ela me perguntou: O endereço está correto? Sim, está correto. 

 Por que “imediatamente”? Esse “imediatamente” estava zumbindo em meus ouvidos. Foi por isso que pedi que o telegrama fosse enviado para mim [por escrito]. Porque muitas vezes tinha acontecido que o telegrama me era enviado por telefone e depois o texto não era enviado para mim. “Enviei imediatamente um telegrama para os superiores provinciais de nossas províncias no exterior. Eu havia prometido a eles que antes de ir para a Europa eu queria visitá-los. Mas eu cancelei a visita em vista do “imediatamente”.

Cheguei em Roma, no Generalato, pensando que seria recebido de tal e tal forma. Lá eles ficaram estupefatos: não enviamos nenhum telegrama, nenhum telegrama! No início eu disse a mim mesmo: por amor de Deus, eles estão brincando, eles estão fingindo. Acontece com freqüência que quando você está constantemente brigando, você coloca um ponto de interrogação em torno de tudo. Mas essas palavras soaram tão sinceras que eu tive que supor que elas de fato não haviam enviado nenhum telegrama. 

Simultaneamente, um segundo telegrama tinha chegado a Milwaukee, também de Roma e assinado por Roma, e também pelo Padre Burggraf. E a segunda parte do telegrama foi literalmente a mesma. Somente a primeira parte foi diferente: Padre Bernardino Trevisan deveria ir “imediatamente” a Roma (ou seja, não vir primeiro visitar-me em Milwaukee). 

E agora a pergunta: bem, qual foi o telegrama certo? Para mim foi claro: no telegrama que recebi, diz “imediatamente”. Portanto, você está viajando de volta imediatamente. Empacotei minhas poucas coisas para não ser novamente marcado como desobediente, e assim apareci em Roma. Imaginem, todos ali estavam perplexos. 

E a pergunta: bem, quem tinha enviado o telegrama? Naturalmente, primeiro foi dito que eu é que tinha encenado tudo, todo tipo de coisas foram ditas. Outros disseram que meus amigos tinham feito isso. O debate se prolongou. [Que] o Papa era da opinião (ele voltou mais tarde ao assunto) que, ao receber o telegrama, eu teria ficado tão surpreso que não o li atentamente, mas, cego, agi precipitadamente para sair do cativeiro. Não foi esse o caso de modo algum. Diante dessas coisas, mantive uma calma soberana; elas não me perturbaram em nada. Não foi nada disso. 

Naturalmente, o telegrama está envolto em mistério. Sim; é assim também. Mais tarde, vou revelá-lo a vocês. 

Assim, a situação ia de um lado para outro.  

E então: chegou uma carta do secretário do Cardeal Ottaviani; e outra carta oficial do Santo Ofício, encorajando-me a submeter ao Santo Ofício o que eu quisesse apresentar a ele. Observe, então, como tudo isso é novidade. Por um lado, o assunto tinha que ser resolvido em particular, eu não devia me dirigir oficialmente ao Santo Ofício, Ottaviani queria fazer isso em particular. Mas agora, por outro lado, havia a exortação, do lado oficial, de submeter ao Santo Ofício o que eu queria expor.

Restaram apenas duas objeções de toda aquela confusão. 

Se pudessem ver apenas a pilha de decretos que recebi durante a minha estada em Milwaukee! E assim sempre aconteceu: quando o decreto deixou uma lacuna (não sei se você sabe o que quero dizer), eu teria me sentido um canalha se não tivesse aproveitado dessa lacuna. Minha interpretação estava correta de um ponto de vista teológico moral. Sempre disse a mim mesmo: eles conhecem as leis de interpretação e eu também as conheço. Se eles querem outra coisa, eles têm que dizer isso explicitamente. É claro que nossos oponentes, especialmente na Sociedade Palotina, indicaram repetidamente que eu havia escapado por esta e aquela lacuna. E a brecha era preenchida. E assim por diante… Havia sempre uma brecha, e eu aproveitava até mesmo a menor brecha. Certamente foi necessária uma coragem tremenda, porque eu sabia (notei isso em minhas viagens internacionais) como até mesmo as altas autoridades da Igreja tremiam quando o Santo Ofício falava. 

É por isso que repito (parece jocoso, mas é muito sério) que para mim foi claro: você tem que mostrar que, com o devido respeito e docilidade, você pode ser franco com o Santo Ofício, seja quem for. 

Quando mais tarde o Cardeal Frings de Colônia atacou Ottaviani no Concílio, escrevi e enviei o seguinte: se o Cardeal de Colônia, assim como todo o episcopado, tivesse sido mais franco com o Santo Ofício, não haveria necessidade de uma reforma do Santo Ofício, nem haveria necessidade de tal confronto público. Digo isto calmamente para que vocês possam ver que eu sempre segui uma linha muito clara. E sempre com uma coragem imperturbável. 

Voltemos às duas acusações pendentes.

Em primeiro lugar: como foi minha obediência e como poderia ser justificada? 

E segundo: Qual era a minha concepção de carisma? Ou seja, a acusação de ter invocado meu carisma perante a autoridade institucional. Eu nunca fiz isso em minha vida, você nunca encontrará um texto meu que diga algo sobre meu carisma. 

O Papa Paulo VI fez essa objeção de acordo com as declarações feitas a dois bispos. 

Talvez você não possa imaginar quantos bispos em todo o mundo tomaram conhecimento de Schoenstatt. Agora somos bem conhecidos. Então muitos vieram me visitar e imediatamente tomaram meu partido, sem que eu tivesse feito ou dito nada, sem que eu tivesse me justificado. 

De fato, naquela época o Papa disse em particular, primeiro ao Cardeal Silva, de Santiago do Chile, e depois ao Bispo Manziana (amigo dele, a quem consagrou bispo): que tudo estaria bem, mas que também seria necessário cuidar para que o carisma fosse subordinado à autoridade institucional. Ele não o disse diretamente, mas certamente insinuou que isso seria minha culpa. 

Seja como for, essas duas eram as únicas objeções restantes. 

Assim, eu mesmo me preparei; tinha trazido algum material comigo, apesar de muito pouco. Eu tinha pensado: Por que carregar todas essas coisas? Eu tinha deixado em Milwaukee toda a “biblioteca” que tinha escrito, e suas cópias, e agora todas essas coisas pendentes de tratamento deveriam ser resolvidas em Roma! Pensei no seguinte: haverá um grande debate, primeiro em particular, com Ottaviani, e depois com a reunião plenária do Santo Ofício. 

Por favor, lembre-se das duas datas. Isso foi planejado para o início de outubro. Mas, no início de setembro, o telegrama chegou. E, muito de repente, aconteceu a reunião de 20 de outubro. E o resultado? Eu era totalmente livre, como um pássaro. Sem mais debate, sem mais reflexão: E quanto à obediência? E quanto ao carisma? Observe que estas foram precisamente as questões centrais tratadas no Concílio. Ou seja, não foram questões tiradas da manga. Eram precisamente as questões centrais. O resultado: a abolição de todos os decretos, todos eles.

Quando o Papa assinou o documento? Em 22 de outubro. Precisamente no dia em que eu havia deixado Schoenstatt em 1951, a caminho do exílio. 

Eu lhes disse que evidentemente houve uma mudança incompreensível no pensamento e na percepção das autoridades supremas. Um dos secretários, que mais tarde se tornou arcebispo consultor da Congregação dos Religiosos, então reconheceu: ninguém no Santo Ofício ainda acredita nas acusações. Ou seja, não houve mais acusações. E por causa delas catorze anos de exílio… Em 22 de outubro de 1951, a partida para o exílio, e agora, em 22 de outubro de 1965, tudo foi abolido. 

A situação continuou a evoluir. Eu estava subordinado à Congregação dos Religiosos. Vocês ouviram a razão da abolição total dos decretos: porque eu queria mudar para a nova pars motrix. Curiosamente, o Superior Geral Pe. Möhler declarou que estava muito decepcionado com o meu desejo de ingressar no novo instituto. Podem imaginar que se poderia estar desapontado com isso? Para mim, era a coisa mais natural do mundo. 

A Congregação dos Religiosos mudou imediatamente sua atitude radicalmente. Eles foram extremamente gentis. Tinham apenas uma reserva (eles não a escreveram no decreto, mas a comunicaram oralmente): no momento eu tinha que ser cauteloso sobre a viagem à Alemanha. Em virtude de que consideração estratégica? Lembre-se que todo o episcopado alemão havia me exilado, e com maior razão ainda, Treves. Podem imaginar tudo o que tinha saído de Treves. Ou seja, foi por uma consideração tática. Lembre-se de Noé, quando ele deixou a arca: antes de deixá-la, ele enviou um par de pombas para ver se as pombas ficariam do lado de fora. Então, foi feita uma tentativa. A pomba podia voar para ver qual era a reação dos bispos alemães.

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Audiência do Pe. Kentenich com o Papa Paulo VI

22 de dezembro de 1965 

[A audiência com o Papa Paulo VI]

Queria lhes dizer algo sobre a audiência. Tudo o que lhes disse até agora é apenas uma certa preparação para isso. Eu mesmo tinha certamente a intenção de pedir uma audiência privada com o Papa. Mas ainda não, porque tudo tinha procedido normalmente, não é verdade? Uma audiência só fazia sentido para mim se estivesse ligada a uma discussão de princípios. Mas todos os órgãos acima mencionados e muitos outros, incluindo a Secretaria de Estado, que antes me havia banido e demonizado, agora tinham um grande interesse em que eu tivesse uma audiência com o Papa. Eu não mexi um dedo por isso, nem no primeiro nem no segundo caso. Vale dizer que isso aconteceu sem qualquer intervenção de minha vontade – não quero dizer contra minha vontade. Portanto, é evidente que outros poderes tinham agido. Poderes humanos concretos, sem dúvida; mas também poderes divinos. 

Por isso, pensou-se no seguinte. Por causa da situação prevalecente em Roma, foi dito: é impossível para o Papa conceder uma audiência privada antes de 29 de dezembro. Há muitos cardeais e bispos que devem se encontrar com o Papa antes de retornar a seus países. Uma audiência particular era a única coisa possível nessa situação.

Então, era 22 de dezembro, havia uma audiência com o Papa. Todas as autoridades haviam se esforçado muito para conseguir um lugar naquela audiência. Em todo caso, a única coisa que era possível era uma audiência particular e não uma audiência privada com o Papa. 

Talvez vocês estejam tão desinformado sobre todos esses mistérios quanto eu estava até aquele momento. É um mundo em si mesmo… o mundo diplomático é um mundo diferente daquele que conhecemos; um mundo com suas próprias leis, pesos e medidas. 

Portanto, haveria uma audiência em 22 de dezembro. Há audiências de massa, audiências privadas (se está em privado com o Papa), audiências especiais (um grupo maior ou menor que depois tem uma audiência), e uma audiência particular. A única coisa possível era, nesse caso, uma audiência particular. 

No fundo estava a idéia da Congregação dos Religiosos: no Natal poderemos ver como reage o episcopado, quando a pomba voa para lá. 

Portanto, observem: benevolência após benevolência. Não era como se houvesse ali um proscrito ou um criminoso. A única coisa possível nessa situação era uma audiência particular. Eu não sabia o que era isso ou como funcionava. Então, me propus a fazer o que os outros estavam fazendo. Estávamos reunidos na sala de audiência. Eu esperava que fôssemos um pequeno número de pessoas. Mas estimo que éramos uns 75. A audiência particular é uma audiência para homens e mulheres que prestaram serviços meritórios à Igreja, e por isso recebem reconhecimento especial do Papa. E entre eles estava agora o até então “delinqüente”.

Não vou contar agora todos os detalhes de como o encontro se desenrolou. Eu tinha um lugar nas filas da frente. Imagine só: tudo é realizado exatamente como prescrito pelo cerimonial. Eu tinha um assento nas primeiras filas. Assim que cheguei em meu assento, um dos cavalheiros do Papa veio e me pediu para sentar na fila de trás. Fora da primeira fila! Pouco depois de estar sentado de um lado, um dos monsenhores que estava ao lado do trono (Monsenhor Wüstenberg, conhecido por mim) veio e me cumprimentou solenemente e me perguntou como eu estava e assim por diante. Vale a pena dizer que todo o cerimonial oficial foi completamente interrompido. Eu lhe disse: eu tenho que ir para trás. Sim, ele respondeu, é pela seguinte razão: o Papa quer lhe dizer algo especial e privado. E ele acrescentou: como o Papa não é fluente em alemão, ele possivelmente o fará em latim. Não demorou muito para que viesse o outro cavalheiro, aquele que você pode ver na foto, Taccoli, o secretário, que manteve o Papa informado sobre nós, em três papados. Houve um grande número (havia também o núncio Bafile, daqui, o quanto ele fez por nós!) É um mundo em si mesmo. Humanamente falando, tudo isso não teria sido possível se todo o mecanismo da diplomacia não tivesse sido posto em marcha no oculto. Mas não esqueça que, de minha parte, eu não mexi um dedo por estas coisas. Meu pensamento era muito reto para isso. Eu não o impedi, mas também não o encorajei.

Bem, as pessoas passavam, uma após outra, de maneira muito simples, de uma forma diferente do que eu havia imaginado. Elas foram ao trono, ajoelharam-se, beijaram o anel, receberam a bênção e foram embora. Aconteceu que quando um pequeno grupo (aparentemente dominicanos, cerca de quatro ou seis) foi formado, eles se ajoelharam juntos e o encontro durou um pouco mais. Palavras foram trocadas. A cerimônia prosseguiu muito rapidamente: um, dois, três, um rosto amável de um para o outro, a bênção foi recebida, rostos amáveis novamente, e o encontro terminou. Esse foi o reconhecimento solene pelos méritos obtidos no serviço à Igreja. 

No final eu estava completamente sozinho no meio do grande salão. O Papa estava sentado ali. Ao seu redor, os dignitários que o acompanharam, se necessário, para atuar como intérpretes ou para dar um tom ainda mais solene ao evento. Ajoelhei-me, beijei o anel. Lá estava eu com minha mala pequena – vocês se lembram dela -podem ve-la na foto. Não muito abatido, não muito quebrantado, mas simplesmente do jeito que estou, certo?: simples e livre. É também por isso que a foto tem um significado especial: não era uma foto oficial. As fotos que vi de ocasiões semelhantes são sempre assim: o Papa posa e os outros posam também. Esta outra foto, por outro lado, foi tirada com total espontaneidade.

Acho a foto muito bonita quando você olha para ela. Quando você conhece o pano de fundo… foi realmente uma conclusão muito original de uma época de luta tremendamente intensa, carregada de tensão e repleta de perigos.

Lembro novamente o quanto tinha rezado durante esses anos para que o Papa tivesse uma “visão de Schoenstatt” (este é apenas um termo técnico), um quadro completo de Schoenstatt. E ele o fez. A audiência foi de fato o fruto de incontáveis orações que vinham sendo feitas há décadas. 

O Papa muito gentilmente me perguntou: Em que língua? Minha resposta foi em latim, não foi? Primeiro, porque eu estava pronto para isso, e segundo, porque era óbvio, já que ele tinha dificuldade para falar alemão. Mas eu não sabia o que se seguiria. Ele virou e me entregou um pedaço de papel com um texto relativamente longo. Você vê o papel na foto. Foi em alemão. Ele então leu solenemente como se fosse uma encíclica… Escutei atentamente, parado ali. Se eu reproduzisse um pouco do discurso, eu poderia dizer muito pouco. Você sabe por quê? Porque foi um único elogio. Imagine o quanto sou indiferente aos elogios hoje. Mas eu notei isto de qualquer forma: isto é mais do que um elogio comum. Nesse contexto, onde tudo acontecia tão oficialmente, onde tudo era tão cuidadosamente pensado, era certamente uma legitimação extraordinária, uma reabilitação. 

Ele terminou de ler. Em seguida, respondi-lhe em latim. Havia basicamente três pensamentos: 

Antes de tudo, agradeci-lhe cordialmente, em nome de Schoenstatt, por tudo o que ele havia feito por Schoenstatt durante seu pontificado, especialmente por ter me reabilitado. É importante dizer que eu fui muito claro. Confesso que eu nunca havia aceitado uma graça. Perdoe-me por dizer isto tão claramente. Isso é o que a honra da Família exige. Isto não tinha nada a ver com a concessão de uma graça, mas devia ser um ato jurídico oficial de reabilitação. 

Uma vez que estas coisas foram resolvidas desta maneira, e depois que o Cardeal Ottaviani foi o primeiro a me cumprimentar pelo meu aniversário, enviando-me um telegrama (imagine!) nunca pensei em devolver a saudação fazendo-lhe uma visita, mas me limitei a agradecer-lhe por escrito. Sabem por que? Eu também nunca lhe ofereci um presente. Eu geralmente gosto de dar presentes. Se você quer algo de mim e eu tenho algo para dar, você pode obter tudo de mim. Mas você não deve querer isso por um senso de justiça, porque assim você não conseguiria um único centavo de mim. Em princípio, nunca fiz isso. Por gratidão, eu dei coisas a pessoas que estavam altruisticamente comprometidas com minha reabilitação. Teria podido visitá-lo só mais tarde, quando o Cardeal confessou solenemente a Taccoli (um gesto muito bonito) que lamentava sinceramente que ele, sem ter manchado sua consciência subjetiva, tivesse sido fundamental para me fazer uma terrível injustiça durante anos. Mas o caso já estava encerrado. Há também um saudável senso de justiça. Não se está sozinho como indivíduo isolado, mas como representante de uma Família.  

Em segundo lugar, prometi ao Papa, em nome de toda a Família, que me comprometeria junto com a Família a realizar a missão pós-conciliar da Igreja da maneira mais perfeita possível. Em seguida, teve início uma troca de opiniões. Vale dizer, acrescentei propositalmente: sub tutela matris ecclesiae, sob a proteção da Mãe Santíssima como Mãe da Igreja. Aparentemente, era sua idéia favorita. Então ele disse: Sim, sim, matre ecclesia. Não”, respondi, “não, não: sub tutela matris ecclesiae”. (150) Sim”, respondeu ele, “você está certo”. 

E a terceira coisa: pela ratificação e perpetuação dessa promessa eu queria dar-lhe o cálice – vocês conhecem o cálice – como um presente para a nova igreja projetada, que teria o título de “Matri Ecclesia”. E eu acrescentei: A matre ecclesia, in matre ecclesia et pro matre ecclesia.

Mas a audiência ainda não havia terminado. Eles notaram então que, comparado a tudo o mais que havia acontecido, era algo bastante fora do comum. Quando eu lhe entreguei o cálice… Os prelados que o rodeavam também se aproximaram dele, apressadamente, para ver o cálice. Naturalmente, eu interpretei isso também como um gesto diplomático. Mas, seja como for, no quadro da totalidade tinha um significado profundo… então ele começou a falar, mas em voz muito baixa, dizendo que eu conhecia o bispo Manziana. Ele era seu amigo, um italiano. Ele esteve em Dachau. Eu havia salvado sua vida naquela época. Quando voltei de Dachau e tinha a intenção de iniciar minhas viagens [internacionais], naquela época era impossível para um alemão atravessar a fronteira alemã. Então,  Manziana obteve um passaporte diplomático de Montini (mais tarde Paulo VI), e assim pude viajar para o exterior.  

Sim, eu respondi, eu o conheço bem. O Papa dizia que ele costumava dizer coisas muito elogiosas a meu respeito. E então ele explicou tudo em particular. E assim a audiência terminou. 

Depois fui escoltado para fora, como o último. Havia muita gente esperando por mim lá fora. 

A audiência foi em 22 de dezembro. Em 23 de dezembro, o Cardeal Antoniutti teve uma audiência privada com o Papa. Ele voltou, me chamou (muito gentilmente, não através de um intermediário, mas diretamente pelo telefone) e me disse que tinha tido uma audiência com o Papa e que eu deveria prestar atenção: o Papa estava me dando permissão para viajar para a Alemanha. Ou seja, por disposição direta e pessoal do Papa, a única restrição que ainda estava em vigor por razões táticas foi abolida. Eu podia então viajar, mas tinha que me lembrar que estava subordinado ao bispo de Munique. Foi novamente um expediente diplomático usual. Eles queriam delegar a responsabilidade a outras autoridades. Portanto, eu tinha que resolver meus assuntos subordinado ao bispo de Munique. E então eu poderia voltar a Roma. E como eu não gosto de ter muito a ver com assuntos diplomáticos, perguntei-lhe imediatamente: Posso ou devo voltar? Mas naquele exato momento eu pensei: você tem que falar diplomaticamente; e como ele não tinha me entendido, acrescentei imediatamente: Sim, sim, voltarei oito dias após a festa, a festa da Epifania. 

E esse foi o fim da questão. 

Vocês sabem agora? Isto deve ter sido uma pequena recreação para vocês. Caso contrário, eu teria explicado tudo de uma forma muito mais sistemática. 

Cronologia das visitações em Schoenstatt e do exílio do Pe. Kentenich em Milwaukee

Tradução: Flavia Ghelardi


NOTAS

140 – Uma amizade por toda a vida se desenvolveu entre o Prelado Ludwig Kaas (1891-1952) e o Padre Kentenich quando ambos estavam sob a mesma bandeira em setembro/outubro de 1916. Eles tinham sido designados para o hospital de reserva militar em Treves, onde serviram até terem recebido a dispensa. O Prelado Kaas dedicou-se primeiro à política e, em 1928, tornou-se presidente do Partido do Povo Católico. Desde 1933 até o final de sua vida, ele trabalhou na Cúria Romana.

141 – A atual Congregação para Doutrina da Fé.

142 – É por isso que o respectivo decreto não foi um “Decretum laudis”, mas um “Prodecretum laudis”.

143 – Indicamos quatro extensos documentos: a “Carta em torno do dia 20” de 1954; as “Notas Crônicas” de 1955; as “Notas Crônicas para o Arquivo” de 1957; e a “Carta ao Superior Geral” dirigida ao Padre Wilhelm Möhler de 1956.

144 – Padre Adalbert Turowski, polonês, Superior Geral dos Palotinos de 1947 a 1953. O Pe. Kentenich manteve com ele uma correspondência volumosa. A carta mais longa foi iniciada em 8.12.1952. Abarca 922 páginas na edição de dois volumes do Pe. Heinrich Hug: “Piedade Sóbria” (vol. 1) e “Fé na Divina Providência” (vol. 2).

145 – Padre Sebastian Tromp (1889 – 1975), jesuíta holandês, tornou-se professor de teologia fundamental na Universidade Gregoriana, em Roma, em 1924. Mais tarde, ele também se tornou consultor do Santo Ofício. De sua caneta saiu a encíclica “Mystici Corporis”. Em 1960, João XXIII o nomeou presidente e secretário da comissão teológica para a preparação do Concílio. Assim, sua influência em Roma e na Igreja foi muito grande, até a primeira sessão em 1962, quando os Padres Conciliares rejeitaram os documentos apresentados pela Cúria Romana. Em 1951, o Padre Tromp foi designado pelo Santo Ofício como Visitador Apostólico da Obra de Schoenstatt. Desde o início ele promoveu (em colaboração com o superior geral dos Palotinos, Padre Wilhelm Möhler) a separação do Padre Kentenich e a anexação total de Schoenstatt à Obra Palotina, o que implicitamente significou a negação dos elementos essenciais de Schoenstatt. Embora em 3 de agosto de 1953, Pio XII tenha terminado a visitação, o Padre Tromp continuou a promover sua política contra Schoenstatt.

146 – Apologia pro vita mea (iniciada em 11.2.1960), publicada sob o título “Por ocasião do Jubileu de Ouro sacerdotal”, Sion Patris, 1985, 225 páginas.

147 – Prelado Josef Schmitz (1900-1986), sacerdote diocesano de Munique e membro do Movimento Apostólico de Schoenstatt desde sua época como seminarista. Na Alemanha, ele era um sacerdote reconhecido na área da pastoral das mulheres. Desde 1932, ele trabalhou na Associação Central em Düsseldorf. Após ter sido dissolvida pela Gestapo em 1939, ele foi conselheiro das mulheres e mães em Munique. Quando o Pe. Kentenich fundou o Instituto dos Sacerdotes Diocesanos em 1945, ele nomeou o Prelado Schmitz como o primeiro Reitor Geral. O Bispo Keller o liberou para esta tarefa e o Prelado Schmitz se estabeleceu em 1952 em Marienau, Schoenstatt, e também participou da Liga e da União dos Sacerdotes Diocesanos na qualidade de presidente da União. Desta forma, ele foi o representante do ramo dos sacerdotes na Presidência Geral. Por causa dos eventos acima mencionados, ele foi demitido no final de novembro de 1962. Com o fim do exílio do fundador, o Prelado Schmitz também foi reabilitado e trabalhou em Marienau para os Ramos dos Padres de Schoenstatt até adoecer gravemente em 1984.

148 – O Prelado Heinrich Roth foi assistente geral das Irmãs de Maria de Schoenstatt, com a aprovação do Santo Ofício. Devido à tensa situação política, as Irmãs tentaram nomear um padre benevolente que não pertencesse a Schoenstatt, temendo que um membro de Schoenstatt não fosse aprovado para este cargo. Também o Prelado Roth, que lealmente representava os interesses das Irmãs na Presidência Geral, foi deposto em março de 1962.

149 – Cardeal Augustin Bea (1881-1968), jesuíta, professor do Antigo Testamento e temporariamente provincial de sua comunidade. Em 1949 foi diretor do Instituto Bíblico em Roma e consultor do Santo Ofício; em 1959 tornou-se cardeal. Durante o exílio do Pe. Kentenich, ele lidou de várias maneiras com o caso de Schoenstatt e tentou mediar.

150 – Provavelmente “sub matre ecclesia”, o que significaria que o Concílio deveria se realizar sob a proteção da Mãe Igreja. Mas o Pe. Kentenich enfatiza: …sob a proteção da Mãe da Mãe Igreja.


* Tanto a introdução como o relato do Pe. Kentenich são extraídos do Kentenich Reader, Volume 1: Encontro com o Pai e Fundador.

Editores: Peter Locher, Jonathan Niehaus, Hans-Werner Unkel, +Paul Vautiér

Texto original publicado na coleção “Propheta locutus est”, t. III, pp. 121-147.